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Fachada ativa: mais de 60% dos comércios nos térreos dos prédios estão vazios em SP

Fachada ativa para alugar na Vila Mariana, em SP Reprodução/Google Street View Ulevantamento feito pela Associação Comercial de São Paulo (ACSP) apontou qu...

Fachada ativa: mais de 60% dos comércios nos térreos dos prédios estão vazios em SP
Fachada ativa: mais de 60% dos comércios nos térreos dos prédios estão vazios em SP (Foto: Reprodução)

Fachada ativa para alugar na Vila Mariana, em SP Reprodução/Google Street View Ulevantamento feito pela Associação Comercial de São Paulo (ACSP) apontou que entre 60% e 80% das fachadas ativas em prédios da capital estão desocupadas. O estudo foi conduzido entre junho de 2024 e junho de 2025 e avaliou os dez anos de aplicação desse tipo de ocupação do espaço urbano, que começou a ser regulamentado com o Plano Diretor de 2014 e a Lei de Zoneamento de 2016. Um levantamento feito pela Associação Comercial de São Paulo (ACSP) apontou que entre 60% e 80% das fachadas ativas em prédios da capital estão desocupadas. O estudo foi conduzido entre junho de 2024 e junho de 2025 e avaliou os dez anos de aplicação desse tipo de ocupação do espaço urbano, que começou a ser regulamentado com o Plano Diretor de 2014 e a Lei de Zoneamento de 2016. 🔎 Fachada ativa é o espaço no térreo de um prédio que, em vez de ser fechado por muros ou grades, é ocupado por lojas, serviços ou comércios que têm entrada direta para a calçada. Construtoras que implantaram esse modelo em empreendimentos localizados nas Zonas de Estruturação Urbana — que ficam perto de eixos de transporte público — tiveram benefícios construtivos importantes. Por exemplo, os espaços físicos das fachadas ativas não são considerados como área computável para efeitos de cálculo da área total construída, ou seja, essa área não conta para o limite máximo de construção permitido. Na prática, equivale a um aumento do potencial construtivo sem custo adicional para as construtoras. Como amostra da pesquisa de campo, foram analisados três eixos na capital: Vila Mariana, Ibirapuera e Rebouças. 📈 Crescimento acelerado, mas sem ocupação Desde a regulamentação, o número de empreendimentos com fachada ativa saltou de 4 para 218 nos eixos de estruturação urbana, segundo o estudo. A proporção de unidades residenciais nos eixos de estruturação também saltou de 6,5% antes da Lei de Zoneamento para 24%. Apesar disso, a pesquisa aponta que a maioria desses espaços permanece fechada. Em muitos casos, não há nem sequer placas de “aluga-se”, o que evidencia a dificuldade de atrair lojistas e comerciantes. Para a urbanista Paula Freire Santoro, coordenadora do LabCidade da USP, o resultado não surpreende. Em conversa com o g1, ela explicou que as fachadas ativas nasceram como parte de uma política que queria estimular o uso misto e a vida nas ruas, mas, na prática, acabaram usadas pelos empreendedores apenas como instrumento para construir mais e pagar menos. "Para as incorporadoras, não importa que a fachada esteja ocupada. O que importa é a área construída não computável que o empreendedor vai ganhar, podendo construir mais, vender mais e aumentar o seu valor geral de venda." Panorama da vacância: bairros mais afetados Os dados de campo trouxeram as seguintes informações: Vila Mariana: maior taxa, com 80% de desocupação (das 45 lojas, apenas 9 funcionavam no momento); Ibirapuera: 70% de lojas vazias (das 43 mapeadas, 13 estavam em operação); Rebouças: menor índice de vacância entre os três eixos analisados, mas ainda alto: 63,3% das lojas desocupadas (31 vazias e 18 ocupadas). Segundo Santoro, porém, o cenário esconde distorções. Em vez de incentivar o comércio local, muitos empreendimentos atraíram apenas lojas de grandes redes ou ficaram vazios. Pequenos negócios, como padarias, açougues e cabeleireiros, não conseguem pagar os altos aluguéis. “O resultado foi o desaparecimento dos comércios de bairro, substituídos por redes gourmetizadas ou pelo vazio”, diz. Por que tantos espaços estão vazios A pesquisa identificou uma combinação de fatores que ajudam a entender a alta vacância: Estacionamento insuficiente ou ausente: considerada a principal barreira. Na Vila Mariana, na Zona Sul, por exemplo, apenas 13,3% das lojas possuíam vagas; Falhas técnicas nos projetos: pé-direito inadequado, ventilação deficiente, carga e descarga inviável; Legislação e comunicação visual: regras de comunicação visual consideradas rígidas pelas empresas e falta de clareza dificultam a atratividade; Dificuldade em atrair e comercializar os espaços: refletida pela ausência de placas de "aluga-se" na maioria das fachadas desocupadas. Paula Santoro acrescenta outros pontos: em razão da falta de atratividade, muitas fachadas ativas foram transformadas em áreas comuns, como salões de festas, ou estão em andares superiores ao nível da rua, o que compromete a ideia de integração entre o prédio e os pedestres. Além disso, moradores de edifícios de alto padrão muitas vezes rejeitam ter bares, restaurantes ou academias no térreo, por medo de barulho ou incômodo. Onde o comércio funciona Nos espaços ocupados, há padrões de uso claros: predominam grandes redes de supermercados e serviços de conveniência, como Oxxo, Minuto Pão de Açúcar, Carrefour e Multicoisas, que têm capacidade financeira de bancar os custos dos espaços. Na Vila Mariana, a categoria "comércio, mercados e variedades" representou 55,56% das lojas ocupadas. No Ibirapuera, também na Zona Sul, o setor representou 30,77% das lojas ocupadas. "Restaurantes, lanchonetes e bares" ocupam uma parcela significativa dos espaços. No eixo Rebouças, na Zona Oeste, foi a categoria mais expressiva, com 33,33% das lojas ocupadas. A pesquisadora relaciona a desocupação ao aumento de custos e à expulsão do pequeno comércio: “Qual comerciante foi para a fachada ativa de um prédio novo? Os que têm maior capacidade de pagamento, porque os preços da terra estavam muito altos. O mercadinho da esquina, o açougue, o cabeleireiro, o pet shop, que estavam ali nos bairros misturados ao uso do solo em lojas, por exemplo, não têm condições de alugar essas lojas”. Fachada ativa ocupada na rua Dr. Melo Alves, no bairro Cerqueira César, em São Paulo Cíntia Acayaba/g1 Futuro das fachadas ativas Segundo a pesquisa da ACSP, as fachadas ativas ainda são um instrumento em amadurecimento. Apesar da vacância alta, elas contribuem para valorizar os empreendimentos e podem dinamizar a vida urbana. O documento aponta recomendações para melhorar a implementação do instrumento: Desenvolver consultorias especializadas no momento da construção dos prédios; Rever regras de comunicação visual; Criar soluções de estacionamento, inclusive áreas específicas para carga e descarga. Para Antonio Carlos Pela, vice-presidente da ACSP e coordenador do Conselho de Política Urbana (CPU) da associação, o levantamento poderá auxiliar nos debates para uma atualização no Plano Diretor da capital, já que o atual tem vigência até 2029: “O CPU tem, a partir desta pesquisa, dados concretos sobre a efetividade da fachada ativa. Dados estes que embasarão os trabalhos técnicos do conselho e da entidade nas discussões a respeito do instrumento, especialmente na futura revisão do PDE em 2029, reforçando seu papel enquanto elo entre a sociedade civil e o poder público na construção de soluções que promovam o desenvolvimento econômico e sustentável da cidade”.