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Quantas calorias tem a sua receitinha fit? A resposta está na química

Como a química e a matemática ajudam a medir as calorias de um alimento? Abra qualquer receitinha no Instagram e lá estará ele: o comentário de “mas quan...

Quantas calorias tem a sua receitinha fit? A resposta está na química
Quantas calorias tem a sua receitinha fit? A resposta está na química (Foto: Reprodução)

Como a química e a matemática ajudam a medir as calorias de um alimento? Abra qualquer receitinha no Instagram e lá estará ele: o comentário de “mas quantas calorias?”. Nesta reportagem, o g1 mostra que dá, sim, para fazer este cálculo de maneira “caseira”, a partir de levantamentos já consolidados por cientistas. E mais: os bastidores das tabelas nutricionais podem dar um gostinho do que é estudar química. ➡️Antes de tudo: qual é a definição de caloria? É a quantidade de energia necessária para que a temperatura de 1 grama de água suba 1 grau Celsius, sob pressão de 1 atm. Em geral, quando falamos em “calorias”, estamos nos referindo informalmente à “quilocaloria” (kcal). E 1 kcal = 1.000 calorias. Exatamente por ser uma unidade de medida de energia, é comum ver a categoria “valor energético” no rótulo dos alimentos. A regra principal: Método de Atwater O método de Atwater — criado pelo químico americano Wilbur Olin Atwater no final do século XIX — calcula a quantidade de quilocalorias de alimentos. Ele parte da ideia de que proteínas, carboidratos e gorduras, quando metabolizados pelo corpo, liberam uma quantidade previsível de energia (kcal). A partir de medições em calorímetros e de estudos de digestibilidade, Atwater chegou a valores médios aproximados que continuam sendo usados na formulação de tabelas nutricionais: Carboidratos: 4 kcal por grama Proteínas: 4 kcal por grama Gorduras: 9 kcal por grama Mais tarde, incluiu-se também o álcool: 7 kcal por grama Mas, se você fizer uma receita em casa, como saber quanto tem de carboidrato, proteína e gordura? É possível consultar tabelas oficiais, montadas por cientistas, e estimar o valor energético do alimento com base em seus ingredientes. Uma alternativa acessível é a Tabela Brasileira de Composição de Alimentos (TBCA), que vem sendo desenvolvida desde 2013 pela Rede Brasileira de Dados de Composição de Alimentos (BRASILFOODS), pela Universidade de São Paulo (USP) e pelo Food Research Center (FoRC/CEPID/FAPESP). Ela leva em conta os padrões dos fabricantes brasileiros e os hábitos alimentares no nosso país. No site, gratuito e aberto a todos, é possível consultar as informações do produto final (como brigadeiro) ou de cada ingrediente (leite condensado, manteiga e chocolate). Por exemplo: um acarajé com sal, em fatia de 80 gramas, terá cerca de 215 calorias. O material explica toda a composição do prato — diz, por exemplo, que há 6,65 gramas de proteína nesta porção. Vamos pensar em uma panqueca de banana com aveia. Olhe só como é possível fazer o cálculo: Ingredientes (porção de 100g) Panqueca de banana Reprodução/Receitas - Globo Aveia em flocos Banana Ovo Manteiga (opcional, pequena quantidade) Canela A tabela já passa a resposta exata: 324 kcal para 100 gramas. Por aproximação, também daria para seguir os valores de Atwater — é só multiplicar a coluna 2 pela 3: Panqueca de banana com aveia O valor obtido (334 kcal) fica muito próximo do informado pela TBCA (324 kcal). Essa pequena diferença pode ocorrer devido às fibras e a arredondamentos nos valores analíticos. “Essa tabela é utilizada pelo IBGE para ver, na pesquisa de orçamento familiar, quanto em média o brasileiro está consumindo de carboidratos e de fibras, por exemplo”, explica o professor Eduardo Purgatto, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP. “Cada país precisa ter sua tabela. O arroz que os americanos compram, por exemplo, é diferente do nosso.” O passo a passo científico Mas como os cientistas descobriram esses valores? Veja o vídeo no início da matéria e, aqui abaixo, um resumo: “Tudo é feito por uma análise química — só que cada uma não sai por menos de R$ 1 mil [o valor depende do método, do equipamento usado e do laboratório]. Por isso, é virtualmente impossível analisar tudo. Nós fazemos um esforço para compilar os dados do máximo possível de alimentos para montar o banco”, diz Purgatto. Tatiana Matuda, engenheira de alimentos e professora no Instituto Mauá, diz que os estudos em laboratório vêm se tornando mais refinados em relação à época em que Atwater criou seu método. “Já conseguimos abrir a categoria de carboidratos e distinguir o que é fibra e o que é amido, por exemplo. São aportes calóricos diferentes”, afirma. Determinar a quantidade de macronutrientes em cada alimento — como lipídios (gorduras) e proteínas — exige análises químicas e equipamentos específicos. No Brasil, os procedimentos seguem metodologias oficiais, como as descritas no manual de referência do Instituto Adolfo Lutz. 🍽️Lipídios (gordura): A gordura é separada do alimento com a ajuda de um solvente (geralmente, o hexano), que tem afinidade com os lipídios. O solvente circula em contato com a amostra e “leva junto” a gordura. “A ideia é que a gordura se junte ao solvente, por uma questão de semelhança de polaridade, e circule junto com ele”, explica a professora Tatiana Matsuda. Depois, o solvente é evaporado, para não poluir o ambiente. O que sobra no recipiente é a gordura pura, que pode ser pesada. Esse é um método gravimétrico, ou seja, baseado na pesagem do material extraído. 🍽️Proteínas O método envolve reações químicas mais complexas e equipamentos de análise prolongada. As proteínas são as únicas moléculas entre os macronutrientes que contêm nitrogênio em sua composição. É um diferencial em relação a carboidratos e lipídios. No laboratório, esse nitrogênio é isolado (pode ser por meio da digestão química com ácido sulfúrico, destilação e titulação) e depois mensurado. Multiplicando a quantidade de nitrogênio pelo fator de conversão (em geral, 6,25), chega-se ao teor de proteína presente na amostra. 🍽️Carboidrato Já os carboidratos, na maioria dos casos, não são medidos diretamente. Primeiro, o laboratório quantifica, em gramas: água, gordura, proteína, fibras e cinzas (minerais). O que sobra em relação em relação à gramatura total é considerado carboidrato. Esse cálculo é chamado de carboidrato por diferença e é amplamente usado em análises de alimentos. Todos os valores que você encontra nos rótulos são descobertos, portanto, por meio de um longo e trabalhoso caminho de pesquisa.