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Nova fusão de buracos negros confirma previsão de Stephen Hawking dez anos depois; entenda

Ilustração mostra a fusão de dois buracos negros, fenômeno que gerou o sinal mais claro já registrado pelo LIGO em 2025. Maggie Chiang for Simons Foundatio...

Nova fusão de buracos negros confirma previsão de Stephen Hawking dez anos depois; entenda
Nova fusão de buracos negros confirma previsão de Stephen Hawking dez anos depois; entenda (Foto: Reprodução)

Ilustração mostra a fusão de dois buracos negros, fenômeno que gerou o sinal mais claro já registrado pelo LIGO em 2025. Maggie Chiang for Simons Foundation Dez anos após a primeira detecção de ondas gravitacionais, a astronomia viveu um novo marco recentemente. O evento GW250114, registrado em 14 de janeiro de 2025, foi descrito como o sinal mais claro já captado da colisão entre dois buracos negros. O registro foi feito pelo LIGO, um observatório com dois gigantescos detectores instalados nos Estados Unidos, um no estado de Washington e outro na Louisiana, que usa feixes de laser para medir distorções minúsculas no espaço-tempo, menores até que o diâmetro de um próton. Foi assim que, pela primeira vez, cientistas conseguiram acompanhar com nitidez cada fase do encontro de dois buracos negros a 1,3 bilhão de anos-luz da Terra. O novo sinal foi três vezes mais claro do que o do histórico GW150914, registrado em 2015, quando as ondas gravitacionais foram detectadas pela primeira vez. E essa “alta definição cósmica” permitiu testar com confiança duas das previsões mais célebres da física moderna: a lei da área de Stephen Hawking, segundo a qual a superfície de um buraco negro nunca diminui, e a descrição de Albert Einstein de que, ao se formar, esses objetos vibram e soam como sinos. O teste de Hawking Para entender o feito, é preciso lembrar o que é o chamado horizonte de eventos: a fronteira de um buraco negro ou a linha invisível que marca o ponto sem retorno do corpo celeste. Dali para dentro, nem mesmo a luz consegue escapar. O físico britânico Stephen Hawking previu, em 1971, que essa superfície jamais encolheria. Em termos simples, todo buraco negro que surge de uma fusão deve ter uma área igual ou maior que a soma das áreas dos buracos negros que o formaram. É uma regra que liga a física dos buracos negros à própria termodinâmica, área da ciência que estuda calor e entropia (ou seja, a medida de desordem de um sistema). Até hoje, essa ideia era considerada uma das mais elegantes da teoria, mas nunca havia sido comprovada com tanta clareza. “Com esse sinal conseguimos mostrar, de forma definitiva, que os buracos negros obedecem à lei da área de Hawking”, explicou ao g1 o físico Maximiliano Isi, professor da Universidade Columbia e um dos líderes da pesquisa. E segundo ele essa confirmação tem um peso que vai além da astrofísica. “É realmente profundo que o tamanho do horizonte de eventos de um buraco negro se comporte como a entropia. Isso tem implicações teóricas muito fortes e significa que alguns aspectos dos buracos negros podem ser usados para sondar a verdadeira natureza do espaço e do tempo”, acrescentou. Simulação da Nasa mostra 'mergulho' em buraco negro Nasa O “toque do sino” cósmico O estudo trouxe outra novidade: pela primeira vez, cientistas conseguiram captar com clareza o chamado ringdown, a fase final de uma fusão de buracos negros. Esse é o momento em que o objeto recém-formado vibra e emite ondas gravitacionais até se estabilizar, como um sino que continua a tocar depois de ser golpeado. Até então, esse eco era tão fraco que mal se distinguia no meio do “barulho” do espaço. Mas o GW250114 permitiu isolar o sinal e identificar dois tons diferentes, algo inédito na história da astronomia. “O toque claro do buraco negro resultante é, sem dúvida, o aspecto cientificamente mais significativo do GW250114. Agora conseguimos extrair dois tons de forma inequívoca, o que nos dá uma visão sem precedentes da estrutura desse objeto extremo”, afirmou Isi. A pesquisadora Katerina Chatziioannou, do Caltech, destacou que essa conquista inaugura uma nova área, chamada de espectroscopia de buracos negros: “As superfícies dos buracos negros estão no coração de um dos maiores problemas da física moderna: a relação entre a gravidade e a mecânica quântica. A lei da área de Hawking oferece uma oportunidade rara de confrontar observações com um conceito teórico fundamental”, disse ao g1. Segundo ela, a clareza do novo sinal marca uma virada para a pesquisa: “Pela primeira vez pudemos ‘ouvir’ de maneira definitiva os sons de um buraco negro e determinar que seu tamanho aumenta. Esse é exatamente o tipo de avanço que transforma detecções em testes de precisão da física fundamental”. LEIA TAMBÉM: 'Lua de sangue': eclipse total deixa Lua vermelha; veja FOTOS É possível viver até os 150 anos ou ser imortal? O que a ciência sabe sobre o limite da longevidade Estudo revela como pterossauros bebês morreram, há 150 milhões de anos Por que isso importa? Os buracos negros são objetos tão densos que nada escapa da sua gravidade, nem a luz. Isso os torna invisíveis diretamente, mas não silenciosos: sua colisão gera ondas gravitacionais, que são deformações no espaço-tempo — o “tecido” do Universo — que se espalham como ondulações na água. Essas ondas foram previstas por Einstein em 1916, mas só confirmadas em 2015, cem anos depois. Desde então, centenas de fusões de buracos negros já foram registradas. O GW250114, porém, é o mais nítido de todos, o que permite comprovar previsões feitas há décadas. Impressão artística de um buraco negro supermassivo em rápida rotação. NASA/JPL-Caltech O novo sinal também reforçou a descrição feita nos anos 1960 pelo matemático Roy Kerr, segundo a qual os buracos negros são incrivelmente simples: ao contrário de qualquer outro objeto, podem ser descritos apenas por duas variáveis: massa e rotação. Essa simplicidade, paradoxalmente, é o que os torna ainda mais desafiadores. “Eles parecem reduzir toda a complexidade a apenas duas características, mas isso levanta perguntas ainda mais profundas sobre o espaço e o tempo”, resumiu Isi. Agora os cientistas olham para frente. Projetos como o Einstein Telescope, o Cosmic Explorer e a missão espacial LISA prometem captar sinais ainda mais detalhados, dez vezes mais sensíveis do que os atuais. Isso pode abrir caminho para detectar fusões muito mais distantes e até encontrar desvios sutis em relação às previsões da relatividade, o que seria a porta de entrada para uma nova física. “Ainda estamos ouvindo apenas os primeiros acordes, mas em breve poderemos escutar a música inteira dos buracos negros”. LEIA TAMBÉM: Descoberta rara: insetos pré-históricos presos em âmbar revelam floresta perdida no Equador Múmias 'defumadas' de 12 mil anos são evidências mais antigas de mumificação humana Cientistas descobrem na Mongólia fóssil do mais antigo dinossauro com 'capacete ósseo'; entenda Robô Curiosity envia imagem de 'cartão postal' de Marte