cover
Tocando Agora:

Fumaça das queimadas pode causar 1,4 milhão de mortes por ano até 2100, diz estudo

Número de queimadas na Amazônia de janeiro a novembro é o maior em 17 anos Adriano Machado/Reuters A fumaça das queimadas, que já é um problema de saúde ...

Fumaça das queimadas pode causar 1,4 milhão de mortes por ano até 2100, diz estudo
Fumaça das queimadas pode causar 1,4 milhão de mortes por ano até 2100, diz estudo (Foto: Reprodução)

Número de queimadas na Amazônia de janeiro a novembro é o maior em 17 anos Adriano Machado/Reuters A fumaça das queimadas, que já é um problema de saúde em várias regiões do planeta, pode se tornar ainda mais mortal nas próximas décadas. 📱Baixe o app do g1 para ver notícias em tempo real e de graça É isso o que apontam dois estudos publicados nesta quarta-feira (17) na revista científica "Nature", que mostram que o avanço do aquecimento global deve aumentar tanto a frequência quanto a intensidade dos incêndios florestais — e, com isso, o número de mortes ligadas à inalação da fumaça. Nos Estados Unidos, a estimativa é de que, até 2050, o país registre cerca de 70 mil mortes adicionais por ano provocadas pela poluição vinda dos incêndios, caso as emissões de gases de efeito estufa sigam altas. Globalmente, o número pode chegar a 1,4 milhão de mortes prematuras anuais até o fim do século. Para chegar nesse número, os cientistas construíram modelos estatísticos e de aprendizado de máquina baseados em dados de emissões de fogo entre 2001 e 2021. Com isso, cruzaram essas informações com registros de todas as mortes nos EUA entre 2006 e 2019. Fumaça tóxica das queimadas: como se proteger A partir daí, calcularam então como a exposição ao material particulado fino (as chamadas partículas PM2.5, minúsculas substâncias presentes na fumaça) pode afetar a mortalidade futura. Os resultados indicam que, no cenário de maior aquecimento, a fumaça dos incêndios poderá provocar 71 mil mortes extras por ano em meados do século. Só a Califórnia, estado que já convive com temporadas de fogo cada vez mais intensas, deve liderar o aumento de vítimas. Nova York, Washington, Texas e Pensilvânia aparecem logo em seguida. O estudo também estima que o custo econômico dessas mortes pode ultrapassar 600 bilhões de dólares anuais em 2050. “Nossa pesquisa sugere que os impactos da fumaça das queimadas provocadas pelas mudanças climáticas podem estar entre as consequências mais importantes e custosas do aquecimento no país”, afirmaram os autores do estudo liderado pelos pesquisadores Minghao Qiu e Marshall Burke, da Universidade de Stanford e de Stony Brook (EUA). LEIA TAMBÉM: Marte e a vida extraterrestre: os resultados da missão Viking ainda debatidos 50 anos depois Rover da Nasa encontra indícios inéditos de possível vida microscópica em rocha de Marte Médicos prescritores de maconha medicinal são processados e enfrentam insegurança jurídica Já o trabalho coordenado por Bo Zheng e Qiang Zhang, da Universidade Tsinghua (China), teve uma escala global. Usando também técnicas de inteligência artificial, os pesquisadores projetaram as áreas queimadas e as emissões futuras até o ano de 2100. Em seguida, rodaram modelos atmosféricos para calcular como a fumaça vai circular e impactar a saúde da população mundial. As projeções mostram que as mortes prematuras ligadas à poluição da fumaça podem crescer seis vezes até o fim do século, alcançando 1,4 milhão de pessoas por ano em um cenário intermediário de emissões. A África desponta como a região mais vulnerável, com um aumento de até 11 vezes nas mortes relacionadas ao fogo. Já nos Estados Unidos e na Europa, o salto esperado é de uma a duas vezes, mas mesmo assim em patamares preocupantes. Os dois estudos, porém, não trazem projeções específicas para o Brasil. Queimadas na Amazônia - fogo consome vegetação perto de Porto Velho na tarde de 23 de agosto de 2019 AP Foto / Victor R. Caivano PM2.5, CO, COV e NOx A fumaça das queimadas não é composta apenas por cinzas visíveis no ar. Dentro dela estão presentes diversos poluentes que, quando inalados, podem trazer consequências graves para a saúde. Em geral, essa mistura tóxica inclui os seguintes compostos: Material particulado (PM2.5) Monóxido de carbono (CO) Compostos Orgânicos Voláteis (COVs) Óxidos de nitrogênio (NOx) e ozônio Metais pesados Um dos mais perigosos é o chamado material particulado fino, conhecido como PM2.5. Essas partículas têm diâmetro de até 2,5 micrômetros, muito menores que um fio de cabelo, o que permite que cheguem profundamente aos pulmões. De acordo com o pneumologista Frederico Fernandes, presidente da Sociedade Paulista de Pneumologia e Tisiologia (SPPT), o contato com esse tipo de poluente provoca inflamação generalizada no organismo. Esse processo pode desencadear doenças cardiovasculares sérias, como arritmias, infarto e derrame. “A exposição prolongada ao PM2.5 também pode agravar doenças respiratórias crônicas, como asma e bronquite, e está associada a um maior risco de câncer e outras condições crônicas, como diabetes”, explica o especialista, que não teve relação com o estudo. A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda que a concentração anual média de PM2.5 não ultrapasse 5 microgramas por metro cúbico de ar para reduzir riscos à saúde. Mas, em muitos episódios de fumaça intensa no Brasil, esse limite é ultrapassado várias vezes. a COP 30 e nosso futuro Outro poluente liberado durante queimadas é o monóxido de carbono (CO), um gás inodoro e altamente tóxico. Ele surge da queima incompleta de madeira, carvão e combustíveis. O problema é que, ao entrar no corpo, o CO se liga à hemoglobina, impedindo que o oxigênio seja transportado pelo sangue. Isso faz com que os órgãos fiquem sem oxigênio, algo vital para a sobrevivência das células. Em grandes cidades, esse gás também é emitido pelo tráfego intenso de veículos, piorando a qualidade do ar. A exposição contínua ao monóxido de carbono também pode trazer sintomas leves, como dor de cabeça e náusea, mas também consequências mais sérias. Prefeitura de Jundiaí/Divulgação Segundo a pneumologista Margareth Dalcomo, “esses elementos desencadeiam uma cascata inflamatória diretamente nas paredes dos brônquios e na vasculatura humana e de outros animais. Os efeitos são graves e podem causar tanto intoxicações agudas quanto exacerbações de doenças crônicas”. A exposição contínua ao monóxido de carbono também pode trazer sintomas leves, como dor de cabeça e náusea, mas também consequências mais sérias. O serviço de saúde britânico, NHS, alerta que casos prolongados podem afetar até a memória e agravar condições cardíacas. Crianças, grávidas e pessoas com doenças respiratórias são ainda mais vulneráveis. Fora isso, a fumaça das queimadas também libera compostos orgânicos voláteis (COVs), substâncias gasosas que podem ser emitidas por produtos como gasolina, pesticidas e cigarro, mas que aparecem em grandes quantidades durante os incêndios. Em ambientes fechados, a concentração pode ser até dez vezes maior do que do lado de fora, aumentando o risco de irritações e infecções. Esses compostos, quando inalados por longos períodos, elevam a probabilidade de câncer e prejudicam órgãos como rins, fígado e sistema nervoso. Fernandes lembra que “o principal problema da exposição crônica aos Compostos Orgânicos Voláteis é o aumento do risco de câncer e o desenvolvimento de doenças pulmonares graves, como a pneumonia de hipersensibilidade. Nessa condição, o pulmão fica cheio de material tóxico, dificultando sua função”. Outros poluentes que aparecem durante queimadas são os óxidos de nitrogênio (NOx) e o ozônio. Eles estão associados a crises de asma, chiado no peito, tosse e falta de ar, principalmente em crianças. O ozônio, em especial, pode agravar quadros de bronquite e, em exposições prolongadas, aumenta o risco de infecções como pneumonia. Além de tudo isso, há ainda a presença de metais pesados, como chumbo e mercúrio, que são extremamente nocivos mesmo em pequenas quantidades. Eles podem comprometer órgãos vitais como cérebro, rins e fígado. Fernandes alerta que “a exposição crônica a esses metais pode ser cancerígena e também causa inflamação sistêmica. Além disso, aumenta o risco de doenças cardiovasculares e respiratórias crônicas”. LEIA TAMBÉM: O que é o “novo normal” do clima? 'Empresas como a Petrobras têm que deixar de ser apenas de exploração de petróleo', diz Marina Silva 'O que aprendi ao viver um ano sozinho com um gato em uma ilha remota' COP30 - Quem são os povos tradicionais do Brasil?