Crise do metanol afeta bares e restaurantes; vendas caem 4,9% no Brasil, mostra levantamento
Setembro foi um mês desafiador para o setor de alimentação fora de casa no Brasil. Após três meses de estabilidade, bares e restaurantes voltaram a registr...

Setembro foi um mês desafiador para o setor de alimentação fora de casa no Brasil. Após três meses de estabilidade, bares e restaurantes voltaram a registrar queda nas vendas: o consumo recuou 4,9% em relação a agosto e 3,9% na comparação com o mesmo período de 2024. Os dados fazem parte do Índice Abrasel-Stone, levantamento mensal realizado pela Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel) em parceria com a Stone, com base em transações financeiras de estabelecimentos de 24 estados brasileiros. O cenário atual é consequência de uma combinação de fatores econômicos e sanitários que têm pressionado o consumo fora de casa. Entre eles, segundo a pesquisa, estão a crise provocada por bebidas adulteradas com metanol, a inflação e o elevado nível de endividamento das famílias. "Setembro já começou com um ritmo abaixo do esperado", explica Paulo Solmucci, presidente da Abrasel Nacional. “Outros fatores também influenciaram o resultado negativo, como a inflação elevada, que restringiu a renda da população, e o impacto dos casos de intoxicação por metanol, que espalhou pânico entre os consumidores e provocou uma queda na movimentação de alguns estabelecimentos". A adulteração de bebidas com metanol criou um forte clima de desconfiança entre os consumidores, especialmente em bares e casas noturnas. O país já registra 41 casos confirmados de intoxicação por metanol, além de 107 em investigação e 469 descartados. Também foram confirmadas oito mortes — seis em São Paulo e duas em Pernambuco. Outros 10 óbitos ainda estão sob análise. Apesar de a maior parte dos casos estar concentrada em São Paulo, no entanto, o estado estava entre os que foram menos afetados em termos de venda, com uma queda de 2,7% em setembro. Segundo o economista da Stone, Guilherme Freitas, esse resultado pode estar relacionado à diversidade do mercado paulista, que oferece mais opções de refeições e serviços de delivery. Esse cenário ajudou a amortecer o impacto da crise. Entretanto, ele observa que os casos de intoxicação só começaram a ganhar destaque na segunda metade de setembro. Ou seja, os efeitos sobre o consumo ainda são limitados nos dados consolidados pelo levantamento. Ao g1, o presidente da entidade reforçou que "não há registro de nenhuma garrafa contaminada com metanol identificada em bares ou restaurantes do Brasil" até o momento. Para ele, essa constatação ajudou a aliviar a tensão e a reafirmar a confiança no setor formal, embora os reflexos da crise tenham sido sentidos de forma imediata. “Os bares especializados em drinks com destilados sofreram uma queda de movimento entre 20% e 25%”, conta Solmucci. “Muitos consumidores preferiram migrar para cervejas ou drinks sem álcool.” Em alguns locais, bebidas como uísque e vodca foram substituídas por cachaça, considerada menos suscetível à falsificação. Ainda assim, a Abrasel observou que o receio dos consumidores não está necessariamente relacionado à experiência nos bares, mas sim à insegurança quanto à origem das bebidas, especialmente aquelas vendidas de forma informal. Funcionários de boteco na Vila Madalena, em São Paulo em 2022 Marcelo Brandt/G1 Pressões econômicas agravam o cenário Além da crise sanitária, o índice revela que o ambiente econômico segue desafiador para o setor. Isso porque a inflação acumulada no segmento de alimentação fora do lar continua elevada — o que pressiona os custos e encarece o tíquete médio. Esse cenário, segundo o economista da Stone, também acaba afastando parte dos consumidores desses estabelecimentos. "A gente vê a inflação fora do domicílio acumulada em 12 meses já em 8,24%, enquanto o IPCA geral está em 5,17%". Paralelamente, o endividamento das famílias brasileiras também permanece alto, o que limita os gastos com itens considerados não essenciais. Além disso, com uma baixa taxa de desemprego, o ritmo de geração de vagas formais perdeu força. "Dados do Banco Central mostram que cerca 28% da renda das famílias está sendo gasto só para pagar dívidas", diz Freitas, da Stone. Segundo ele, ainda é cedo para cravar a magnitude do impacto — especialmente ao considerar o porte e o modelo dos negócios. "Como o primeiro fim de semana com a crise já estabelecida foi o de 4 e 5 de outubro, essa segmentação mais fina ficará mais clara com a leitura de outubro em si", explica. Freitas destaca que, em setembro, o efeito aparece de forma parcial no dado agregado e é mais influenciado pelo contexto macroeconômico do que pela crise do metanol em si. Entre os 24 estados analisados, apenas Maranhão (2,6%) e Mato Grosso do Sul (1%) apresentaram crescimento nas vendas. Já as maiores quedas foram registradas em Roraima (11,5%), Pará (9,9%), Rio de Janeiro e Santa Catarina (7,6%), além de Paraíba e Sergipe (7%). Reação do setor Diante do impacto da crise e do temor do público, a Abrasel passou a adotar uma estratégia para tentar reconstruir a confiança do consumidor. Uma das principais ações foi o lançamento de um treinamento gratuito obre segurança na compra de bebidas. Desde os primeiros casos de intoxicação, mais de 15 mil empresários se inscreveram nos cursos, que seguem sendo oferecidos diariamente e estão disponíveis no site da Abrasel. O conteúdo do treinamento reúne orientações práticas que ajudam os empreendedores a adotar medidas preventivas e reforçar a credibilidade do setor. Entre as principais recomendações estão: 🧾 Compra segura: adquirir bebidas apenas de fornecedores confiáveis e sempre com nota fiscal. 🔍 Verificação de produtos: observar rótulos, lacres e preços suspeitos. “Se você está acostumado a pagar R$ 100 por uma bebida e encontra por R$ 50, não compre. Provavelmente é falsificada”, alerta Solmucci. ♻️ Descarte correto de garrafas: inutilizar as embalagens após o uso, danificando o gargalo para evitar que falsificadores as reutilizem. 🤝 Transparência com o consumidor: mostrar notas fiscais, garantir visibilidade dos rótulos e lacres e manter uma postura de “transparência absoluta”, como reforça o presidente da entidade. Cautela nas estratégias comerciais Apesar da necessidade de reaquecer as vendas, Solmucci não recomenda que os empresários lancem promoções agressivas para acelerar o giro dos estoques. A avaliação é que descontos podem gerar interpretações equivocadas, passando a impressão de que o produto foi adquirido a preços baixos e, portanto, poderia ter origem duvidosa. “Nosso foco é garantir a confiança do consumidor”, afirma. “Promoções podem passar uma ideia errada de que se comprou barato.” A expectativa, segundo ele, é que o setor retome gradualmente o crescimento com base em transparência, capacitação e segurança. caipirinha Freepik/Reprodução