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Artesão recolhe madeira em trilhas e cria peças sustentáveis no coração da Caatinga, no Sertão de Alagoas

Sertanejo de AL representa o orgulho nordestino em peças de madeira da vegetação nativa No Sertão nordestino, entre mandacarus e galhos retorcidos pelos lon...

Artesão recolhe madeira em trilhas e cria peças sustentáveis no coração da Caatinga, no Sertão de Alagoas
Artesão recolhe madeira em trilhas e cria peças sustentáveis no coração da Caatinga, no Sertão de Alagoas (Foto: Reprodução)

Sertanejo de AL representa o orgulho nordestino em peças de madeira da vegetação nativa No Sertão nordestino, entre mandacarus e galhos retorcidos pelos longos períodos de seca, a arte de Bruno Soares nasceu sob o sol quente da Caatinga, bioma exclusivamente brasileiro. Em Senador Rui Palmeira, no Sertão de Alagoas, ele recolhe madeiras secas da vegetação nativa para transformá-las em peças sustentáveis que carregam história, memória e o orgulho do Nordeste. Filho do Sertão, Bruno cresceu em meio ao cenário árido da Caatinga, que cobre os nove estados nordestinos e parte do Norte de Minas Gerais. Foi nas trilhas entre serras e veredas que ele descobriu, quase por acaso, a vocação artística. Aos quase 30 anos, dedica-se à criação de itens como pendentes, canecas, suportes e objetos decorativos feitos com madeiras secas recolhidas da natureza, sempre respeitando o ciclo natural das árvores. Assim como cada madeira que ele, gentilmente, recolhe da natureza, as peças criadas por Bruno são únicas. E a cada trilha pelo Sertão, o amor e o respeito pela natureza criaram uma conexão que gerou oportunidades para o sertanejo. ✅Clique aqui para seguir o canal do g1 AL no WhatsApp O g1 AL desbravou as rotas sertanejas do estado para saber mais sobre as peças feitas por Bruno e as curiosidades desse bioma que ocupa cerca de 44% de Alagoas. 🥾 Das trilhas ao artesanato e a preservação da natureza Natural de Senador Rui Palmeira, Bruno conta que o interesse pelo artesanato começou cedo, quando via seu pai fazendo brinquedos, como tratores e carrinhos, através de latas de óleo. Foi assim que começou: observando seu pai e fazendo brinquedos para ele e seus irmãos. Hoje ele se declara um apaixonado por trilhas e pela conexão com a natureza. São de cidades como Piranhas, São José da Tapera, Poço das Trincheiras e Santana do Ipanema que saem as maiores inspirações para suas obras, mas ele conta que nem sempre foi assim. "Eu tinha muito medo de subir em serras e um certo dia uma amiga e uma prima minha me chamou para subir uma serra que foi a Pedra de Lampião aqui em Senador e eu sempre dizia ‘eu não vou porque eu não quero ir pro meio do mato não’, aí assim mesmo me convenceram e eu acabei indo e, ao chegar lá, eu consegui me sincronizar com a natureza", relembra. Segundo ele, depois da primeira vez, nunca mais parou. Ele conta que fazer trilhas, acampar na Caatinga e se sentir próximo da natureza foi como um vício. Foi lá que Bruno passou a observar o jeito e o formato das madeiras secas caídas e tendo vontade de criar suas peças. São em suas criações que Bruno fala sobre preservação e conscientização do bioma. Ele usa suas peças para conscientizar as pessoas a não poluir, desmatar nem fazer queimadas na Caatinga. De acordo com ele, o seu trabalho leva a natureza para dentro da casa das pessoas. "Essas peças, essas madeiras que eu coleto no meio da natureza, aquela madeira que já foi envelhecida e já caiu, eu utilizo ela no meio de uma reciclagem. Eu reciclo aquela madeira para fazer as peças. E muitas pessoas derrubam aquela árvore verde para fazer carvão, para fazer estacas", fala. Alagoano representa o sertão em peças artesanais Arquivo pessoal Entre trilhas e criações, Bruno encontrou seu lugar de paz na natureza. "Uma das experiências que a natureza mais trouxe para minha vida, que eu gosto muito de lembrar, é o conhecimento, de conhecer as árvores, de conhecer animais que habitam ali, e o cuidado, né, o cuidado, a preservação", fala. 🪵👨🏽‍🎨As Kuksas e as peças em madeira As Kuksas são canecas feitas de madeira e as peças favoritas de Bruno. Com madeira de Umburana, uma árvore conhecida no Sertão pelo valor medicinal, o artesão começou a criar por necessidade: como não levava copos plásticos nas trilhas, criou seus próprios copos com as madeiras caídas por lá. "Eu gosto muito de fazer ela porque é uma das peças que exige muito cuidado, exige paciência e também tempo para fazer, porque ela é uma peça muito demorada para ser feita. A madeira também me ajuda muito a fazer o entalho, porque é uma madeira fácil de entalhar", disse. Ao g1 ele contou que começou a fazer ali mesmo. Levava facas para esculpir e criava suas peças enquanto fazia as trilhas. "Peguei um pedaço de tábua e comecei a fazer uma, teve minha primeira e depois chegou a evolução, foi evoluindo o formato delas, modificando algumas coisas e sempre me aperfeiçoando e fazendo mais peças. Depois já fiz uma por encomenda para um amigo que faz trilha comigo e depois foi, tipo, pessoas me pedindo para me fazer, e assim eu tenho várias peças delas", compartilhou. Além das Kuksas, Bruno também faz pendentes, luminárias, facas, colheres, carrinhos de boi e itens de decoração como esculturas de cactos e de Lampião e Maria Bonita. "O Sertão alagoano se manifesta nas minhas criações, na beleza da vegetação, que é a Caatinga, que é a partir dela que eu tiro algumas matérias-primas para criar os abajures, os lustres. Uma peça que pode ser transportado para fora do estado, para fora da nossa área de Sertão, né? É sobre trazer o sertão para dentro de casa através dessas peças", fala. Veja as peças feitas pelo sertanejo 🌵A Caatinga A Caatinga, tão falada por Bruno, já esteve presente nas músicas mais tocadas do Rei do Baião Luiz Gonzaga. Foi falando da Asa Branca, que bateu asas do sertão, e do mandacaru florido na seca, que o Rei do Baião tornou conhecida a paisagem do Nordeste. Ao g1, Bruno contou encontrar alguns animais durante suas trilhas pela caatinga. "Aqui na área de caatinga, o que mais vê é os roedores né? tipo mocó, teiú, essas coisinhas. Agora os outros animais, tipo cobra, os animais grandes, é muito difícil de ver. O único que eu vi aqui assim mais perto na área caatinga foi o furão", relembra De acordo com o Instituto do Meio Ambiente (IMA) a fauna da caatinga é conhecida pela resistência diante das adversidades geográficas. Ainda segundo o IMA, o mandacaru se destaca no bioma e representa a resistência do Sertão nordestino. "Apesar da ideia comum de que a Caatinga tem baixa biodiversidade, a realidade é que ela abriga uma rica diversidade, adaptada às longas estiagens e transições climáticas", disse o técnico ambiental do IMA Johnson Sarmento. O órgão desempenha trabalhos de proteção ao bioma na Área de Proteção Ambiental (APA) da Serra da Caiçara, que está localizada entre os municípios de Maravilha, Poço das Trincheiras, Santana do Ipanema, Ouro Branco e Canapi - onde Bruno faz algumas de suas trilhas. As APAs são regiões naturais que permitem ocupação humana, mas que possuem algumas diretrizes de manuseio. O IMA realiza fiscalizações no bioma porque crimes ambientais são frequentes e passados de geração em geração, como o desmatamento para fazer carvão e a criação ilegal de aves. Segundo Johnson, essas práticas prejudicam o equilíbrio ecológico da região. "Ela [a APA da Serra da Caiçara] desempenha um papel crucial não apenas na proteção da biodiversidade, mas também na preservação do patrimônio cultural e histórico da região. Além da rica fauna e flora, a APA protege elementos arqueológicos e paleontológicos e assegura a identidade cultural das comunidades tradicionais, como os quilombolas, que são parte importante desse ecossistema", explicou o técnico. Conheça algumas curiosidades sobre o bioma: O mandacaru serve de alimento para animais e faz parte das plantas não convencionais comestíveis (PANC); A caatinga tem espécies como o tatu bola da caatinga, que foi símbolo da Copa de 2014; Durante o período seco a maioria a das plantas perde suas folhas e os troncos apresentam-se secos e esbranquiçados, o que caracteriza uma paisagem aparentemente monótona; A caatinga tem mais de 500 espécies de árvores. *Estagiária sob supervisão de Michelle Farias Alagoano cria peças com madeira caída da Caatinga Arquivo pessoal Assista aos vídeos mais recentes do g1 AL Veja mais notícias da região no g1 AL